Juntar as coisas. Cada livro, cada CD, cada DVD. As camisas, calças, as roupas do momento de lazer. As coisas que precisavam de conserto e nunca foram consertadas. As pastas com poeira. Que segredos elas guardaram durante o tempo de convivencia, em que nunca as toquei por respeito? Uma ultima checagem na casa. Caixas que vieram com a mudança e ainda não arrumadas. Ter certeza de que tudo foi devidamente empacotado para que nada ficasse para trás e motivasse uma nova visita. Tudo para não ter que tratar alguém que foi tão intimo como um estranho. O tratamento cordial. A vontade de dizer coisas que machucassem. Ao mesmo tempo, a vontade de pedir que ficasse. O esforço para manter o tom de voz amigável. O rosto sem emoções aparentes. A promessa de um contato futuro. Sempre fica algo para trás. Há sempre coisas que precisam ser devolvidas. Há sempre coisas que ficam sem ser ditas. Mas também há o cansaço do esforço de buscar formas de fazer as coisas acontecerem. De manter o viço do sonho, de manter o calor das promessas. O esforço de não se deixar abater com as desilusões seguidas, sequenciais, num crescendo exponencial... O esgotamento. A descoberta de que não existe mais energia para fazer com que as coisas aconteçam como se queria. A ultima gota de vontade de ficar escorrendo pelo ralo... Indo embora. O espaço vazio. A brisa. O silêncio. É certo que um dia este dia será lembrado, como muitos outros, sem fazer o coração doer.
Brasília, 19-01-2012